Nanotecnologia contra o tempo: óxido de zinco para a preservação de filmes históricos contra a “síndrome do vinagre”
O cinema, por vezes chamado de “a sétima arte”, é não somente fonte de entretenimento, mas de informações sobre a cultura de cada época. O filme, o principal objeto do cinema, é obtido a partir do registro de várias imagens sequenciais, de forma a se obter um vídeo, que pode ser gravado em materiais de mesmo nome, os filmes, ou de forma digital. Buscando preservar esses conteúdos, entre 1920 e 1950 os filmes de nitrato de celulose, extremamente inflamáveis e tóxicos, foram substituídos por seus semelhantes em acetato de celulose, mais seguros de armazenar. Contudo, esse material não era ideal e começou-se a notar um fenômeno que foi apelidado de “síndrome do vinagre”. Sob calor, umidade e acidez, o acetato de celulose perde os grupos acetil, que são transformados em ácido acético e aumentam a acidez do ambiente, acelerando ainda mais esse processo e gerando uma ampla degradação do material (Fig. 1). Isso gera perda de conteúdo dos filmes e o descolamento de seus suportes, tornando-os inutilizáveis.
Figura 1: Reação responsável pela “síndrome do vinagre”, onde os grupos acetil são clivados do polímero e se transformam em ácido acético, ambos respectivamente em vermelho
Fonte: Autoria própria
Uma das principais estratégias utilizadas atualmente neste cenário é o uso de compostos inorgânicos para neutralizar o ácido acético, sendo os principais deles o hidróxido de cálcio (CaOH), o carbonato de cálcio (CaCO3) e o óxido de zinco (ZnO). Essas substâncias conseguem transformar o ácido acético (CH3COOH) em sais de acetato, de forma que não se aumente a acidez do meio, conforme reações mostradas abaixo:
Ca(OH)2 + 2CH3COOH → (CH3COO)2Ca + H2O
CaCO3 + 2CH3COOH → (CH3COO)2Ca + H2O + CO2
ZnO + 2CH3COOH → (CH3COO)2Zn + H2O
Buscando preservar as obras de artes cinematográficas produzidas ao longo dos 30 anos de uso do acetato de celulose, cientistas desenvolveram nanopartículas carregadas com Ca(OH)2, CaCO3 o e ZnO para remediar a “síndrome do vinagre”. As nanopartículas carregadas com ZnO obtiveram melhor desempenho, com a capacidade de adsorver 121% do seu peso em ácido acético e devolvendo 120% dele convertido a sais de acetato, restando somente 1% de ácido acético residual.
O uso de nanopartículas de ZnO na preservação de filmes de acetato de celulose representa um avanço promissor no enfrentamento da “síndrome do vinagre”, uma das principais ameaças à integridade de acervos audiovisuais históricos. Essa aplicação da nanotecnologia mostra como a ciência de materiais pode oferecer soluções eficazes e sustentáveis para a conservação de bens culturais, unindo inovação e preservação da memória, garantindo que futuras gerações tenham acesso a registros visuais e sonoros fundamentais da história.
Para mais informações, acesse:
PORPORA, Francesca; LISI, Lorenzo; CARRETTI, Emiliano; D’ALEO, Carlotta; SANCTIS, Marianna de; BALDINI, Samuele; DEI, Luigi. Adsorption of Acetic Acid Vapors by Inorganic–Organic Nano Materials: implications for the inhibition of the ⠼vinegar syndrome⠽ in 20th century motion picture films. Molecules, [S.L.], v. 30, n. 6, p. 1348, 17 mar. 2025. MDPI AG. http://dx.doi.org/10.3390/molecules30061348.