Tecnologia versus empregos

Tecnologia versus empregos

Contraposição: no vídeo “Humans need not apply” [3], é discutido sobre tecnologias que poderão mudar profundamente o mercado de trabalho, de modo que humanos perderão cada vez mais espaço. Já Andrew McAfee [5], durante uma palestra realizada no TED Talks, aborda a questão de uma forma mais otimista. Você já chegou a pensar sobre isso?

Bruno Akio Shirasuna e Victor Gomes Nicola

A era da informação

O advento da Terceira Revolução Industrial, também conhecida como Revolução da Informação, implicou em profundas modificações no cenário mundial, mais especificamente no mercado de trabalho, no qual o desenvolvimento da área de informática e tecnologia da informação provocou a adoção de um novo tipo de paradigma de trabalho. Como resultado, o nível de produtividade das indústrias cresceu graças à inserção de ferramentas que permitiram que tarefas, antes executadas ao custo de muito tempo e por um grande grupo de funcionários, fossem realizadas por um menor contingente humano e de forma mais rápida. Esses avanços contínuos e dinâmicos seguiram ocorrendo e trazem à tona alguns questionamentos que estão se tornando cada vez mais relevantes: Qual o impacto da tecnologia no mercado de trabalho? Desenvolver tecnologias novas acaba com os postos de emprego ou cria novos?

Para iniciar essa reflexão, é interessante observar que, dentre tantas outras mudanças, um dos avanços de maior destaque trazido pela tecnologia foi o inigualável progresso nos meios de comunicação. Nunca na História da humanidade a comunicação foi tão rápida e eficiente como no século XXI. Isto acarretou fortes consequências nos relacionamentos interpessoais e acelerou o fluxo de informações no mundo. Nas indústrias, não foi diferente.

Por conta da evolução dos meios de comunicação, os processos industriais, dos mais diversos tipos, ganharam em eficiência uma vez que a troca de informações passou a ser realizada em menos tempo. A obtenção de informações de forma mais ágil tem como consequência tomadas de decisões antecipadas, menor tempo de reação a variações de mercado, um acúmulo maior de informações e, consequentemente, maior chance de sucesso para a empresa.

Avanços como esses afetam o mercado como um todo. Atualmente, as instituições possuem eficientes formas de estreitar relações com seus consumidores, pois elas têm a oportunidade de fazer uso do meio digital. As maneiras como as instituições aproveitam tais oportunidades varia para cada uma delas, de acordo com sua estrutura organizacional, cultura empresarial, seu mercado consumidor, sua concorrência, etc.

As diferentes influências que motivam uma instituição a adquirir novas tecnologias criam contextos diferentes para o mercado em que ela atua, e as consequências decorrentes dessas motivações variam de caso para caso. Por exemplo, inúmeras empresas de varejo migraram parte de seus negócios para o meio digital, oferecendo compra e venda de produtos em plataforma online. No Brasil, tem sido comum grandes empresas abrirem suas lojas virtuais e atraírem clientes que normalmente não frequentariam suas lojas físicas [2]. Com as lojas virtuais, o processo de compras é facilitado e a empresa que o adota ganha vantagem competitiva [2].

O mesmo aconteceu com diversos serviços fornecidos por bancos, que passaram a realizar transações por meio de plataformas seguras e eficientes conectadas à internet. Como consequência, houve um impacto no fluxo de pessoas que vão às agências físicas, sem diminuir o número de clientes, implicando diretamente na necessidade de intermediários entre clientes e os serviços oferecidos. Nesse contexto, empregos como atendentes, ajudantes e caixas perdem valor, pois o custo de manter um serviço online equivalente é comparativamente mais baixo, mesmo que isso exija um investimento inicial considerável. Muitas demissões são decorrentes dessa desvalorização. Da mesma forma, a manutenção de lojas físicas se torna mais cara quando a precificação é realizada em comparação ao custo da loja online.

Por outro lado, é cada vez maior a necessidade de profissionais que desenvolvem  esses tipos de tecnologias, que entendam como elas funcionam e que saibam manipulá-las. A tecnologia da informação ganhou destaque e tornou-se um mercado aquecido. Profissionais dessa área tornam-se suficientemente capacitados para atuar em instituições dos mais diversos setores.

Novos mercados e empregos surgiram ao longo dos últimos anos. Plataformas de compartilhamento de vídeos online trouxeram uma nova forma de renda aos criadores de conteúdo, principalmente no campo do entretenimento, ao servirem como um meio de publicidade. O caso do Youtube é um dos mais famosos, havendo indivíduos ou grupos que se dedicam de forma integral a essa atividade, já que podem conseguir uma boa remuneração.

Outra tecnologia que revolucionou a última década foi a dos smartphones. A sua linha evolutiva trouxe tantas funcionalidades que é difícil imaginar um limite para as suas possíveis aplicações. Com eles, a comunicação instantânea e o acesso a mídias sociais tornaram-se partes essenciais à sociedade atual. A velocidade com que a comunicação acontece aumentou tanto que não só modificou as relações sociais, como também teve grande impacto, direto e indireto, no mercado de trabalho.

A substituição de serviços por meio dos aplicativos disponíveis para smartphones ocorreu em outras áreas também. Um exemplo recente é o do Uber. O tradicional serviço de táxi, bem consolidado, teve a sua demanda ameaçada com o crescimento do aplicativo. Algumas características explicam o seu repentino sucesso: praticidade para chamar o serviço, um sistema de avaliação que ajuda a manter um controle de qualidade e, possivelmente a principal qualidade, o baixo custo em comparação ao táxi. Com o slogan “Dirija quando quiser ganhe o dinheiro que você precisa”, também atraiu aqueles em busca de renda extra ou que estão desempregados [10].

Mais do que motoristas humanos: Uber pode estar adotando carros autônomos em breve.

Segundo Mattoso, J. (2000, p.03) “Somente em uma versão estática e em um universo ceteris paribus pode-se supor que um maior crescimento da produtividade seja automaticamente equivalente a um menor crescimento do emprego e, conseqüentemente,
maior desemprego no plano nacional.”. Ou seja, o aumento da produtividade trazido pelas tecnologias não necessariamente impactará em um cenário de desemprego em massa [6].

Ainda segundo o autor, o aumento da produtividade impacta no mercado de trabalho de maneira cíclica, hora trazendo desemprego, hora gerando empregos, sempre restaurando o equilíbrio para o mercado. Isto ocorre pela própria natureza das vantagens que a tecnologia proporciona às empresas. Essas vantagens eliminam barreiras às empresas, mas trazem ao mercado novas necessidades e, assim, tendências são criadas, restaurado o ciclo de empregabilidade.

Outro fator bastante comum é que muitas vezes as tecnologias trazem aplicações diferentes daquelas para as quais foram concebidas e são utilizadas em novos contextos, favorecendo a imprevisibilidade de alterações no mercado [7]. O aplicativo de navegação Waze é um bom exemplo disso, por ser utilizado em parceria com o Uber, ajudando o novo serviço a se consolidar no mercado.

O futuro

Tendo sido apresentadas visões do presente e um pouco do passado, é natural que seja questionado: qual será a previsão para o futuro?

Robôs da Boston Dynamics: uso da tecnologia para replicar a natureza.

É unânime dizer que o ritmo de desenvolvimento dos avanços tecnológicos anda a passos cada vez mais apertados. Não basta apenas analisarmos as novas tecnologias em termos de quantidade, novidade e eficiência, mas também é necessário discutir o papel que elas desempenham. Se durante a Terceira Revolução Industrial tivemos como principal novidade a tecnologia da informação, servindo ferramentas aos seres humanos, hoje estamos vivenciando um momento de transição no qual as máquinas possuem maior autonomia para atuar sem intervenção humana. Com tecnologias tais como as contidas em inteligência artificial e robótica, muito se especula sobre a possibilidade de estarmos passando por uma nova revolução, que poderia impactar não somente os paradigmas atuais de trabalho, mas também o modo como pensamos acerca de diversos aspectos da nossa sociedade.

Em um vídeo do Youtube intitulado “Humans need not apply” [3] do canal CGP Grey, o autor é enfático ao citar que já existem tecnologias que poderão mudar profundamente o mercado de trabalho e, assim como já ocorreu no passado, certos empregos estão destinados a serem extintos, sendo apenas questão de anos até que elas consigam ser implementadas. Mais surpreendente do que isso, empregos ameaçados não são apenas os relacionados a trabalhos mecânicos e repetitivos ou simples do ponto de vista lógico, mas pode chegar a afetar campos em que o processo criativo é mais requisitado, por exemplo, no contexto das artes, com algoritmos inteligentes que conseguem criar músicas, pinturas, dentre outros e, também, na área de desenvolvimento de softwares existem programas com inteligência artificial que conseguem codificar sozinhos. O tom do vídeo é bastante pessimista, sugerindo que nos adaptemos a uma realidade ainda muito vaga e que haja uma reestruturação sobre como pensamos o funcionamento de como trabalhamos.

Em contraste, o cientista do MIT Andrew McAfee apresentou uma palestra no TED Talks em 2012 [5] abordando a questão de uma forma mais otimista. Segundo a sua visão, a criação de mais e mais tecnologias apenas tende a beneficiar o ser humano individualmente e também a sociedade como um todo, aproximando-se, guardadas as devidas proporções, da filosofia positivista. Segundo dados apresentados por ele, a Internet é um exemplo de tecnologia que teve impactos socioeconômicos positivos e, portanto, colabora para tornar o mundo melhor para todos.

Reflexões finais

A conclusão para as questões levantadas no início do texto é que existe uma incerteza e insegurança com relação às perspectivas de futuro. O impacto de uma tecnologia nova será medido de acordo com o contexto em que ele ocorre e o resultado (geração ou eliminação de empregos) dependerá do momento de observação e seus desdobramentos, pois, de forma geral, o mercado de trabalho funciona de maneira cíclica e empregos eliminados podem ser restituídos, e novos mercados e tendências podem ser favorecidos de maneira contra intuitiva, trazendo benefícios inesperados. Porém, como os avanços tecnológicos trazem vantagens competitivas às empresas e, consequentemente, serviços melhores aos consumidores, o impacto na sociedade é positivo e isso também pode ser levado em consideração ao medir o impacto no mercado de trabalho.

 

Referências bibliográficas

[1] AUED, BERNADETE. PROFISSÕES NO PASSADO – PROFISSÕES NO FUTURO. Revista de Ciências Humanas – UFSC, v. 15, n. 22, 1997. Disponível em: <https://periodicos.ufsc.br/index.php/revistacfh/article/view/23450/21120>. Acesso em: 25 jul. 2017.

[2] GERAÇÃO INTERATIVA. 10 grandes lojas virtuais estreiam no 1º trimestre de 2015. Disponível em: <http://geracaointerativa.com.br/noticias-marketing-digital/10-grandes-lojas-virtuais-estreiam-no-1o-trimestre-de-2015.html>. Acesso em: 07 out. 2017.

[3] GREY, CGP. Humans need not apply. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=WMF-Z74C1QE>

[4] KUPFER, DAVID. TECNOLOGIA E EMPREGO SÃO REALMENTE ANTAGÔNICOS?.  Novo Desenvolvimentismo: Um Projeto Nacional de Crescimento com Equidade Social. Ed. Manole, São Paulo, capítulo 11, 2005. Disponível em: <https://www.researchgate.net/publication/288823354_TECNOLOGIA_E_EMPREGO_SAO_REALMENTE_ANTAGONICOS>. Acesso em: 12 ago. 2017.

[5] MCAFEE, ANDREW. Are Droids taking our jobs?. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=WMF-Z74C1QE>

[6] MATTOSO, JORGE. TECNOLOGIA E EMPREGO, uma relação conflituosa. Scielo, São Paulo, v. 14, n. 3, jul./set. 2000. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext>. Acesso em: 03 jul. 2017.

[7] O GLOBO. Tecnologia cria mais empregos do que destrói, aponta estudo. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/sociedade/tecnologia/tecnologia-cria-mais-empregos-do-que-destroi-aponta-estudo-17228160>. Acesso em: 05 jul. 2017.

[8] PUBLICO. Tecnologia vs (des)emprego. Disponível em: <https://www.publico.pt/opiniao/jornal/tecnologia-vs-desemprego-24700213>. Acesso em: 05 jul. 2017.

[9] SUPERINTERESSANTE. Emprego que não acaba mais. Disponível em: <https://super.abril.com.br/tecnologia/emprego-que-nao-acaba-mais/>. Acesso em: 05 jul. 2017.

[10] UBER. Dirija. Disponível em: <https://www.uber.com/pt-br/drive/>. Acesso em: 07 jul. 2017.

[11] VERIOS. A tecnologia gera ou destrói empregos?. Disponível em: <https://verios.com.br/blog/a-tecnologia-gera-ou-destroi-empregos/>. Acesso em: 05 jul. 2017.