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porLuiz Menna-Barreto e Mario PedrazzoliresumoEsta edição da Revista Estudos Culturais foi dedicada a estudos sobre o tempo, tema recorrente em diversas áreas do conhecimento e que vem adquirindo relevância crescente num mundo globalizado no qual as pessoas acabam se expondo a desafios inéditos até meados do século XX. Atravessamos fusos horários, acompanhamos bolsas de valores em Tóquio e Nova York e assistimos a jogos que ocorrem do lado oposto do planeta, numa sucessão de eventos que acontecem em tempos próprios e que nem sempre coincidem com os tempos de cada indivíduo. Surge nesse contexto certa tensão entre nossas percepções da passagem do tempo, aquela interna que dialoga com nosso sono ou fome e a outra externa, imposta pelos vários relógios aos quais tentamos obedecer. Dessa tensão emergem reflexões que trazemos aos leitores, reflexões inspiradas em diferentes olhares que vão desde aspectos filosóficos e sociológicos a aspectos biológicos.
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Sobre os autores
resumoLuiz Menna-Barreto, Mario Pedrazzoli, Robert Levine, Muara Kizzi Figueiredo, Rafael H. Silveira, Rafael Chequer Bauer, Alexandre Panosso Neto e Luiz Gonzaga Godoi Trigo escrevem no número dois da Revista de Estudos Culturais. -
Ordem e progresso, aceleração e alienação
porRafael H. SilveiraresumoComo diversos exemplos dados em Aceleração e alienação [1] [1] ROSA, Hartmut. Beschleunigung und Entfremdung: Entwurf einer kritischen Theorie spätmoderner Zeitlichkeit. Traduzido do inglês para o alemão por Robin Celikates. Berlim: Suhrkamp Verlag, 2013. confirmam, a condição de especialista no campo da aceleração social muitas vezes não exime o próprio autor da ação dos fenômenos por ele analisados – sobretudo por se tratar de uma das personalidades acadêmicas mais conhecidas, citadas e requisitadas na imprensa alemã atualmente. Como minha resenha da análise de Hartmut Rosa mostra, a obra está longe de ser die Entdeckung der Langsamkeit ou um éloge de la lenteur, como interpretado por alguns. No diálogo, conduzido em 23/10/2014 na cidade de Jena, Alemanha, originalmente em alemão, transcrito, editado e traduzido para o português por Rafael H. Silveira, são abordados pontos que complementam o entendimento da Teoria da Aceleração através de uma perspectiva voltada para a realidade brasileira. -
Tempo e bem estar
porRobert LevineresumoNeste artigo examino o impacto da experiência temporal – o emprego do tempo, concepções do tempo e normas temporais - sobre a felicidade e o bem estar; sugiro políticas públicas voltadas à ampliação dessa experiência. Inicio com uma revisão da literatura relativa às interrelações entre o tempo, dinheiro e felicidade. Em segundo lugar, reviso dados e questões em torno dos horários de trabalho e não trabalho ao redor do mundo. Em terceiro lugar, descrevo numa perspectiva mais ampla as questões temporal que deveriam ser levadas em consideração nas decisões de políticas públicas, por exemplo, medidas de relógio versus eventos, enfoques monocrônicos versus policrônicos, definições de tempo perdido, ritmo de vida e orientação temporal. Concluo com sugestões para a elaboração de políticas do emprego do tempo voltadas para aumentar a felicidade individual e coletiva. Trata-se de um truísmo virtual o modo como empregamos nosso tempo se expressa no modo como vivemos nossas vidas. Nosso tempo é o bem mais valioso do qual dispomos. Boa parte desse tempo, no entanto, é controlado por outros, desde nossos empregadores até nossos familiares mais próximos. Também está claro que existem diferenças profundas – individuais, sócio econômicas, culturais e nacionais – no grau de controle que indivíduos exercem sobre seus próprios tempos (ver p. exemplo LEVINE, 1997; LEE, et al., 2007). Pode ser argumentado que políticas públicas são necessárias para proteger os “direitos temporais” dos indivíduos, particularmente aqueles mais vulneráveis à exploração. Este artigo foi motivado por um projeto de largo espectro do qual tive a oportunidade de participar. O projeto começou na primavera de 2012 na sequência de uma resolução da ONU, aprovada por unanimidade em sua Assembleia Geral, na qual “felicidade” foi incluída na agenda global. O Butão foi convidado a receber um grupo interdisciplinar de “experts” internacionais com a tarefa de elaborar recomendações para incentivar a busca da felicidade no planeta; mais especificamente desenvolver um “novo paradigma para o desenvolvimento mundial”. O Butão é um pequeno país pobre, cercado de montanhas na região do Himalaia, foi escolhido para essa tarefa em função do pioneirismo de seu projeto de “Felicidade Nacional Bruta” - FNB (Gross National Happiness - GNH). “Progresso” na definição dos autores desse projeto, “deveria ser visto não apenas através das lentes da economia como também a partir de perspectivas espirituais, sociais, culturais e ecológicas”. Felicidade e desenvolvimento, em outras palavras, dependem em mais fatores do que o crescimento e acumulação de capital. Inglaterra, Canadá e outros países e organizações de dimensões nacionais seguiram na mesma direção do Butão, estabelecendo medidas de FNB (LEVINE, 2013). Um dos domínios centrais do índice de FNB do Butão é “emprego do tempo” que correspondeu à minha participação no relatório do grupo de estudo. Este artigo está bastante apoiado naquele relatório e nas inferências que o projeto me proporcionou. Discuto quatro conjuntos de temas: I. As interrelações entre tome, dinheiro e felicidade. Máxima importância, qual a relevância do emprego do tempo com o bem estar e a felicidade? II. Emprego do tempo: questão dos horários e políticas de organização do trabalho. III. Outors fatores tempais que devem ser considerados ao formularo políticas de promoção de felicidade.. IV. Sugestões para elaboração de políticas: a chamada para uma “Lei de Direitos Temporais”. -
A ilusão dos relógios: uma ameaça à saúde
porMario PedrazzoliresumoA mecanicidade ou digitalidade dos relógios representa a imutabilidade da duração de frações de tempo. A contagem das 24h de um dia teve como referência, a princípio, as pistas ambientais associadas às condições do dia e da noite que são diferentes em diferentes locais da terra e portanto mutáveis. A emergência de uma sub-área da Biologia, a Cronobiologia, em meados do século XX permitiu a interpretação de que a apreensão do tempo de um dia como regularidade mecânica aliena os seres humanos da percepção da temporalidade diária como integração entre temporalidade ambiental e temporalidade biológica. Pretendo demonstrar que esse equívoco perceptual da duração do tempo de um dia pode ter como consequência uma desorganização temporal fisiológica que é a origem ou está associada a origem de muitas doenças modernas. -
Os horários fora de lugar – ritmos biológicos e literatura
porMuara Kizzy FigueiredoresumoEste trabalho analisa a relação existente entre personagens e ambiente e objetiva investigar como, supostamente, se deu a implantação no Brasil do século XIX dos ritmos sociais europeus, tendo em vista os ritmos biológicos da população brasileira (em termos coletivos) – adaptada ao ambiente tropical. Para tal estudo, foram analisados alguns textos literários do período (em especial a obra de Machado de Assis e Eça de Queirós) - visando identificar menções aos horários de sono, refeições, atividades sociais e aspectos do sono; bem como a leitura de autores contemporâneos que discutem a construção de identidades nacionais – em especial no Brasil – e ainda; autores que investigam a temática do tempo – seja em termos cronológicos, psicológicos e biológicos. -
Slow movement: reação ao descompasso entre ritmos sociais e biológicos
porRafael Chequer Bauer, Alexandre Panosso Netto e Luiz Gonzaga Godoi TrigoresumoEste artigo discute o descompasso entre os ritmos biológicos e os ritmos sociais emergentes a partir da Revolução Industrial. Para tal, são apresentados indícios de mudanças rítmicas nas últimas décadas, acarretando um processo contínuo e profundo de aceleração e mecanização sociocultural, predominante nas estruturas societárias capitalistas. Em seguida, discute-se a relação entre ritmos sociais e ritmos biológicos, com a contribuição conceitual advinda da Cronobiologia. Por fim, destaca-se o processo de surgimento e consolidação do Slow Movement nas últimas décadas, tornando-se mais um indício da desarticulação temporal vivenciada nos dias atuais. -
Os tempos da vida
porLuiz Menna-BarretoresumoO tema do tempo tem atraído bastante atenção no ambiente acadêmico contemporâneo. Apresentarei uma abordagem na qual são associados os conceitos de condicionamento reflexo clássico com a cronobiologia, área na qual a dimensão temporal da matéria viva é explorada. O conceito de antecipação é proposto como elo central dessa associação. Discuto a seguir os níveis de determinação que podem ser propostos a partir da observação de fenômenos temporais nos organismos. Concluo com as noções de desafios e armadilhas temporais que parecem caracterizar fortemente os dilemas humanos num mundo globalizado, conduzindo a diferentes processos de adaptação resultantes desses desafios e armadilhas. -
Resenha do livro Aceleração e alienação: Esboço de uma teoria crítica da temporalidade na Modernidade tardia, Harmut Rosa
porRafael H. SilveiraresumoEm Aceleração e alienação: Esboço de uma teoria crítica da temporalidade na Modernidade tardia, Hartmut Rosa recapitula resumidamente e amplia sua Teoria da Aceleração Social. A ampliação da teoria se dá em primeiro lugar através da análise de elementos desaceleradores da tendência aceleratória e, em seguida, da análise das consequências da aceleração para a Teoria Crítica social atual, cujos questionamentos levantados e respostas dadas até o presente momento não apresentariam uma solução para a perda da credibilidade do projeto da Modernidade, uma vez que a aceleração social teria sucumbido e instrumentalizado a possibilidade de autonomia prometida. Partindo da busca de uma resposta à questão de o que seria uma vida plena, Rosa retraça, assim, o contexto do surgimento de diferentes categorias de alienação, retratando em sua teoria uma tendência social crescente extremamente relevante e em crescimento na era moderna.
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editorial
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sobre os autores
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Funk ostentação em São Paulo: imaginação, consumo e novas tecnologias da informação e da comunicação
Funk ostentação em São Paulo: imaginação, consumo e novas tecnologias da informação e da comunicação
porAlexandre Barbosa PereiraresumoO artigo aborda a configuração recente de um movimento musical, protagonizado principalmente por jovens de origem pobre, em São Paulo, o funk ostentação. A partir da pesquisa em casas noturnas e da observação de videoclipes na internet, explora-se a importância das referências a marcas de diferentes produtos e bens de valor elevado e a imagem como componente fundamental para a apresentação e divulgação desse estilo musical. Nesse circuito funk, a proposição de Arjun Appadurai sobre a centralidade do deslocamento pelas migrações e novas tecnologias da comunicação mostra-se como um caminho importante para se refletir sobre esse funk a partir da ideia de imaginação. -
Marcos fundamentais da Literatura Periférica em São Paulo
Marcos fundamentais da Literatura Periférica em São Paulo
porAntonio Eleison LeiteresumoA literatura da periferia de São Paulo se divide em dois períodos históricos: a) Literatura Marginal, de 2000 a 2005 e b) Literatura Periférica, a partir de 2005 até os dias atuais. A primeira fase teve como marco inaugural a publicação do livro Capão Pecado, de Ferréz, no ano 2000, obra muito influenciada pela cultura hip hop, especialmente o RAP. Este escritor foi o principal nome dessa fase, sendo também seu maior articulador, ao coordenar inúmeras coletâneas literárias que proporcionaram o surgimento de dezenas de autores. O segundo período é marcado pela ascensão dos saraus, principalmente do Sarau da Cooperifa. Este Coletivo publicou sua antologia em 2005 e estimulou diversos saraus a fazerem o mesmo. Viabilizados, em boa parte, por políticas públicas, perto de 200 livros, coletivos e individuais, foram lançados desde então, configurando um vigoroso movimento cultural. Entretanto, passados 12 anos, a rubrica periférica e/ou marginal se mostra insuficiente para identificar essa prática literária. Este artigo apresenta duas hipóteses para superação desse problema. A primeira é contextualizar a literatura periférica como uma dimensão da cultura popular urbana, ampliando assim o seu alcance como expressão cultural, sem prejuízo da sua identificação de origem. A segunda é de ordem estética e implica na afirmação da busca da qualidade como um imperativo da criação. Esse desafio, porém, requer, por parte dos escritores, uma disposição para se submeterem à crítica, ao mesmo tempo em que torna-se necessário um novo paradigma crítico que possa responder à especificidade dessa literatura. -
Estudios culturales en América Latina
Estudios culturales en América Latina
porEduardo RestreporesumoDuas grandes confusões parecem operar, com frequência, nos discursos em torno dos estudos culturais na América Latina. A primeira é a equivalência de estudos culturais e estudos sobre a cultura. A segunda, muito frequente no contexto estadunidense, é misturar sob o rótulo de estudos culturais a produção heterogênea de intelectuais latino-americanos que abordaram assuntos de cultura e poder e a de acadêmicos latino-americanistas das universidades do Norte. Neste artigo se evidenciam os problemas de ambas as confusões e se sublinham algumas de suas nefastas consequências para a articulação de um projeto intelectual e político de estudos culturais na América Latina. -
Valesca Popozuda: ministra da Educação
Valesca Popozuda: ministra da Educação
porAristóteles BerinoresumoOs chamados funks sensuais fazem parte da cultura juvenil da cidade do Rio de Janeiro. Valesca Popozuda é uma das suas principais estrelas, amplamente conhecida através das mídias. As vozes femininas do funk chamam atenção pelas letras que narram façanhas e fantasias que destoam da imagem que são destinadas ao sexo feminino. São vozes que que presentificam existências recalcadas pelo falocentrismo dominantes nas narrativas sobre o amor, o sexo e a vida na cidade. Seus aspectos políticos e culturais são agora estudados e debatidos. A política convencional também desperta para a cultura popular das periferias. O artigo lembra dois encontros ocorridos entre Lula e Valesca Popuzada, nos anos de 2008 e 2009. Oportunidade para a funkeira entregar ao então presidente uma letra de música que fala da favela, do funk, dos jovens e até da possibilidade de ser ministra da Educação. O artigo discute a intromissão das vozes femininas dos funks sensuais na vida das cidades como agenciamento politicamente significativo através das interpelações que produz. Na tradição dos estudos culturais, se propõe a problematizar o poder através também da criação popular no circuito da cidade. -
Rolezinhos: Marcas, consumo e segregação no Brasil
Rolezinhos: Marcas, consumo e segregação no Brasil
porRosana Pinheiro-Machado e Lucia Mury ScalcoresumoNo início de 2014, o fenômeno conhecido como rolezinho ganhou ampla visibilidade nacional e internacional. Trata-se de adolescentes das periferias urbanas que se reúnem em grande número para passear nos shopping centers de suas cidades. O evento causou apreensão nos frequentadores e fez com que alguns proprietários dos estabelecimentos conseguissem o direito na justiça de proibir a realização dos rolezinhos, barrando o acesso dos jovens. Desde então, emergiu um amplo debate sobre segregação na sociedade brasileira. Com base em uma pesquisa etnográfica sobre consumo popular com jovens da periferia de Porto Alegre, o artigo analisa o fenômeno dos rolezinhos, abordando suas dimensões locais, nacionais e globais. Levando em consideração o atual momento brasileiro, que versa sobre políticas de ascensão social via consumo e sobre uma onda de protestos de inquietação social, argumentamos que os rolezinhos estão se modificando e encontrando diversas formas de discutir e realizar política cotidiana no âmago de uma sociedade segregada. -
Matriz biológico-cultural da existência humana: fundamentos para aprender, ensinar e educar
Matriz biológico-cultural da existência humana: fundamentos para aprender, ensinar e educar
porMaria Elena Infante-MalachiasresumoNeste ensaio apresentamos uma reflexão sobre a matriz biológico-cultural da existência humana a partir da epistemologia da Biologia do Conhecer, que considera o conhecimento a partir do sujeito que conhece. A matriz que constitui o cerne da Biologia Cultural corresponde à trama relacional onde o homem surge se realiza e conserva o seu viver humano. Nesta trama relacional que se inicia em um processo histórico que teve a sua origem há bilhões de anos, surgem todos os mundos que vivemos como as distintas dimensões do nosso viver cultural. Discutimos a relevância desta perspectiva, que considera ao mesmo tempo a constituição biológica e a cultura, para as relações humanas do ensinar e aprender e destacamos a possibilidade de transformação que surge ao considerar o outro como um legítimo outro na convivência. -
Ethnical Afro Tourism in Brazil
Ethnical Afro Tourism in Brazil
porLuiz Gonzaga Godoi Trigo e Alexandre Panosso NettoresumoO artigo desenvolve uma discussão teórica sobre o turismo étnico afro no Brasil. A temática somente recentemente tem merecido a devida atenção dos estudiosos, motivo pelo qual se justifica a abordagem. Os objetivos são três: 1) revisar a história das culturas afros no Brasil; 2) identificar as forças que garantem o respeito a essas identidades e; 3) analisar como os destinos afro devem ser trabalhados neste contexto. A metodologia empregada é a revisão teórica dos textos que abordam a cultura afro brasileira, tendo como pano de fundo da discussão os delineamentos dos estudos culturais. Conclui-se que o produto turístico com base na cultura afro é um produto viável no Brasil, porém deve primar pelos quesitos de respeito, alteridade, ética e valorização de todas as culturas envolvidas no processo. -
Alfabetização científica e cartográfica no ensino de ciências e geografia: polissemia do termo, processos de enculturação e suas implicações para o ensino
Alfabetização científica e cartográfica no ensino de ciências e geografia: polissemia do termo, processos de enculturação e suas implicações para o ensino
porVeronica Guridi e Valeria CazettaresumoNeste trabalho realizamos uma análise crítica com relação ao significado do conceito “alfabetização científica” dentro do campo da Educação em Ciências e em Geografia. Constatamos que o termo é ainda bastante polissêmico e que dependendo do enfoque adotado, se seguem diferentes implicações para o ensino de Ciências. Concluímos mostrando uma definição do termo que incorpora elementos dos recentes estudos na área bem como da vertente dos Estudos Culturais em Educação. -
A fome antropofágica - utopias e contradições
A fome antropofágica - utopias e contradições
porFernanda Oliveira Filgueiras Santos e Mauro de Mello LeonelresumoO Modernismo no Brasil significou um marco, que anunciou o fim de um período cultural caracterizado pelo legado e pelo conservadorismo. O Movimento Antropofágico foi a síntese artística e intelectual dessas reflexões. Este trabalho se propõe a discutir as contribuições e controvérsias deixadas pelo movimento no contexto de urbanização e cosmopolitismo em que ele emergiu na cidade de São Paulo. -
A versão encantada da pós-modernidade
A versão encantada da pós-modernidade
porMauro de Mello Leonel e Maira MesquitaresumoO livro em epígrafe tem como objetivo principal relatar com rigor cronológico as origens das versões de pós-modernidade ("não como idéia, mas como fenômeno"), remontando ao modernismo. Numa abordagem incomum o autor percorre, no tempo e nas circunstâncias, as dimensões estéticas, históricas e políticas da express -
Dossiê "Temporalidades"
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Editorial
Editorial
poros editoresresumoA Revista Estudos Culturais chega agora ao seu número três, no mesmo momento em que o Programa de Pós-Graduação em Estudos Culturais da EACH-USP completa seu sexto ano de atuação. O amadurecimento de nossas empreitada é marcado pela amplitude dos temas desta edição da Revista. O campo dos estudos culturais, sempre liberto das amarras disciplinares tradicionais, aparece aqui em várias de suas múltiplas chaves. -
Sobre os autores
Sobre os autores
resumoEduardo Wanderley Martins, Carlos Velázquez, Damián Cabrera, Madalena Pedroso Aulicino, Daniela Signorini Marcilio, Agnès García Ventura, André Vitor Brandão Kfuri Borba e Mariana Moreira. -
Mídia: o Novo Totem Dessacralizado
Mídia: o Novo Totem Dessacralizado
porEduardo Wanderley Martins e Carlos VelázquezresumoO presente texto tem como objetivo refletir sobre a função de mediação da Mídia para o Sagrado, partindo da concepção de Mídia como novo totem nas sociedades contemporâneas. Sob a metodologia indutivo-analítica de base bibliográfica e documental, explora-se a hipótese de que a mídia, como novo totem nas sociedades midiáticas , cumpre a função organizadora, mas não a função mediadora. A mídia não liga as aspirações e necessidades humanas ao Transcendente, encerrando em si mesma a satisfação dessas aspirações através do fornecimento de bens simbólicos, mas que não têm contato com suas fontes originárias – não há relação com o Sagrado. Dessa forma, a mídia se apresenta nas sociedades midiáticas como um totem dessacralizado - oferece bens de grandes valores universais, mas desprovidos de lastro divino. -
Literatura paraguay/guaraní - transversalidades
Literatura paraguay/guaraní - transversalidades
porDamián CabreraresumoPassando por trabalhos compilatórios dos escritores paraguaios Augusto Roa Bastos e Rubén Bareiro Saguier, e a partir de discursos literários e não literários, analisa-se a ambiguidade fundada na palavra guarani; que designa, indistintamente, uma língua, uma cultura, uma etnia; e que, por metonímia, constitui-se em apelido-gentílico dos paraguaios. Relações entre literatura paraguaia e literatura Guarani são exploradas, desde a perspectiva dos autores citados; tanto conhecedores e divulgadores da mesma, como dois dos poucos paraguaios capazes de ultrapassar um cerco de isolamento cultural graças, em parte, ao exílio político; sob a luz de uma tradição crítica latino-americana hispanizante que, enquanto invisibiliza a literatura paraguaia, contribui com uma mistificação dela, fundada em sua peculiaridade linguística, seja ela real ou inventada. -
O brincar e o saber de experiência: uma forma de resistir
O brincar e o saber de experiência: uma forma de resistir
porMadalena Pedroso Aulicino e Daniela MarcílioresumoO brincar é uma atividade livre e séria, possui finalidade autônoma e é um intervalo da vida cotidiana (HUIZINGA, 2005; CAILLOIS, 1990). A criança se desenvolve, adquire experiência, constrói e transmite sua cultura lúdica brincando (WINNICOTT, 1979; BROUGÈRE, 2008). Mas, que brincar é esse promovido e recomendado na atualidade? O objetivo desse artigo é refletir sobre a redução do tempo da infância em prol de uma ideologia da produção e do consumo, que valoriza a informação, o conhecimento e o aprendizado técnico e científico, e reduz o “saber de experiência” (BONDÍA, 2002). Nesse contexto, a retomada do brincar como atividade livre e uma experiência de vida seria uma possibilidade de resistência aos valores vigentes. Constatou-se que os Estudos Culturais como estratégia crítica e política podem contribuir para repensar o brincar hoje. -
Investigación feminista, historia de las mujeres y mujeres en la historia en los estudios sobre Próximo Oriente Antiguo
Investigación feminista, historia de las mujeres y mujeres en la historia en los estudios sobre Próximo Oriente Antiguo
porAgnès García VenturaresumoSuele decirse que el estudio del pasado siempre tiene relación con el presente y con el futuro, bien porque presente y futuro se construyen a su imagen y semejanza, bien porque no podemos imaginar un pasado sin los referentes de nuestro presente. Por este motivo, ocuparse de la historia de las mujeres en la Antigüedad y de cómo incluir a las mujeres en la historia, nos permite reflexionar acerca de la situación de las mujeres en el mundo presente en el que vivimos y en el mundo futuro en el que querríamos vivir. En este artículo propongo aproximarnos a este tema con las herramientas críticas de la investigación feminista, ilustrando la propuesta con algunos ejemplos acerca de cómo algunos sesgos pueden afectar al modo en que se aborda el estudio de las vidas de las mujeres en el Próximo Oriente Antiguo. -
A higienização do século XIX e o "contra corrupção" do século XXI: Similaridades no discurso das elites no Brasil
A higienização do século XIX e o "contra corrupção" do século XXI: Similaridades no discurso das elites no Brasil
porAndré VitorresumoCada momento histórico é único, mas carrega em si tensões permanentes, num paradoxo entre o novo e o velho, valendo-se de novas experiências sem, entretanto, negar toda a bagagem cultural adquirida. Assim, este trabalho busca relacionar dois momentos distintos da história do Brasil, mas com características em comum: a higienização do início da República e o momento recente, em que estava em jogo o mandato da presidente Dilma Rousseff. Por ser o Brasil um país com pouca mobilidade social e sem alterações substanciais no seu controle político, veremos como os interesses das camadas superiores da sociedade se reproduzem e se perpetuam, no intuito de fazer a população aderir a essa ideologia em favor de seus interesses privados. -
Resenha do livro Memória Coletiva e Identidade Nacional, Miryam Santos
Resenha do livro Memória Coletiva e Identidade Nacional, Miryam Santos
porMariana MoreiraresumoA presente resenha aborda o livro “Memória Coletiva e Identidade Nacional”, de autoria de Myrian Sepúlveda dos Santos. Importante pesquisadora de temas como memória, identidade, práticas políticas, culturais e relações raciais, obteve seu título de doutora em Sociologia pela New School for Reserch de Nova Iorque e desenvolveu pesquisas em pós-doutorado no Centro de Estudos Latino-Americanos da University of Cambridge; no Centro de Pesquisa sobre Relações Sociais da Université de Paris V e no Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. Atualmente é professora associada da Universidade do Estado do Rio de Janeiro e coordena o Grupo de Pesquisa Cultura e Poder, registrado no CNPQ Arte, e o museu Afrodigital. Suas análises abordam teorias de nomes de grande relevância para os Estudos Culturais como Karl Marx, Walter Benjamin, Michel Foucault, Maurice Halbwach, Stuart Hall entre outros.
Tempo e bem estar
Os horários fora de lugar – ritmos biológicos e literatura
A ilusão dos relógios: uma ameaça à saúde
A mecanicidade ou digitalidade dos relógios representa a imutabilidade da duração de frações de tempo. A contagem das 24h de um dia teve como referência, a princípio, as pistas ambientais associadas às condições do dia e da noite que são diferentes em diferentes locais da terra e portanto mutáveis. A emergência de uma sub-área da Biologia, a Cronobiologia, em meados do século XX permitiu a interpretação de que a apreensão do tempo de um dia como regularidade mecânica aliena os seres humanos da percepção da temporalidade diária como integração entre temporalidade ambiental e temporalidade biológica. Pretendo demonstrar que esse equívoco perceptual da duração do tempo de um dia pode ter como consequência uma desorganização temporal fisiológica que é a origem ou está associada a origem de muitas doenças modernas.
The mechanistic or digitality of watches is the immutability of the length of time slices. However, historically 24 hours timing had as a reference, at first, the environmental cues associated with the conditions of the day and night that are different in different places on earth. The emergence of a subfield of biology, Chronobiology in the mid-twentieth century led to the interpretation that the apprehension of time of a day as mechanical regularity alienates human perception of daily temporality as the integration between environmental and biological temporality. I intend to show here that this perceptual misunderstanding of the 24h temporality can result in a physiological temporal disorganization that is the source or is associated with the source of many modern diseases.
Mecanismos de medição da contagem do tempo de um dia e seu referencial natural
Os grandes e suntuosos relógios mecânicos datam do século XIV, antes disso as formas de marcação da passagem do tempo de um dia sempre estiveram, na história humana, associados a eventos na natureza que se repetem sequencialmente com esta temporalidade, sendo os mais óbvios o dia e a noite e suas particularidades como os crepúsculos e o formato da sombra de um mesmo objeto ao longo da fase iluminada de um dia. Tais fatos são perceptíveis ou aparecem como estímulos para os sistemas sensoriais como decorrência da posição da terra em relação sol. Podemos imaginar que para comunidades agrárias que viveram antes da invenção dos relógios mecânicos, o tempo da passagem de um dia era o ritmo da natureza, ou seja, era a temporalidade a ser apreendida para se manter o modo de produção da vida, desde que a criação dos animais e o cultivo das plantas foi, e em parte ainda é, ligado a este ciclo claro/escuro.
O aparecimento dos relógios mecânicos, a princípio, não significou uma alteração imediata na contagem do tempo diário. As pessoas, na Idade Média europeia, não estavam em busca de um mecanismo de contagem do tempo, pois eram extremamente sensíveis às pistas temporais presentes na natureza. Kevin Birth (2011) numa análise histórica da contagem do tempo na Europa medieval nos mostra que o cantar do galo era um indicativo e servia de referência para a contagem. O famoso relógio de Estrasburgo na França, um dos primeiros na Europa, apresentava um autômato de galo que batia as asas e cocoricava, simbolizando a relação historicamente construída pelas pessoas com o cantar dessa ave como indicativo da hora do dia.
Do ponto de vista biológico o galo canta não como reação ao aparecimento do sol, mas sim como antecipação a este fenômeno. Estudos em Biologia mostram que o cantar do galo se dá de fato como parte da regulação temporal fisiológica no seu organismo, portanto como um ritmo biológico (SHIMMURA; YOSHIMURA, 2013). Este fato deixa em evidência que mesmo com o aparecimento dos relógios mecânicos, a princípio a contagem do tempo estava ligada a fenômenos naturais.
Historicamente a transição da forma de contagem do tempo a partir dos ritmos da natureza para os relógios mecânicos se deu como uma mudança ideológica acompanhada de uma espécie de amortecimento da percepção. A representação da passagem do tempo pelos ponteiros do relógio, a princípio presa nos fenômenos naturais, se dobrou sobre si mesma de forma que as horas do relógio passaram a ser representadas pelas horas de outros relógios. O tempo diário que era contextualizado a partir da localidade geográfica na qual vivia o observador passa a ser descontextualizado da localidade a partir da massificação do uso dos relógios mecânicos. O tempo medido nestes aparatos possibilitou a emergência, na cultura humana, da ideia do tempo em si, um tempo preciso, acurado, homogêneo e ubíquo.
O dia de fora e o dia de dentro
O dia exterior
A Terra, em sua rota pelo espaço, faz um movimento de rotação ao redor do seu próprio eixo norte-sul, no sentido anti-horário. O tempo que leva para girar 360º em relação ao Sol é de aproximadamente 24h, tempo o qual consideramos a duração de um dia. Além deste movimento a Terra realiza também o de translação que consiste no avanço ao longo de uma trajetória levemente elíptica ao redor do Sol. O plano perpendicular ao eixo de rotação da Terra faz um ângulo de aproximadamente 23º relativo ao plano do equador solar.
Da composição destes dois movimentos e do eixo inclinado do planeta deriva o padrão dia e noite sob o qual vivem os seres vivos no nosso planeta. Embora pareça uma informação geográfica trivial, na verdade quando analisados cuidadosamente, estes fatos trazem explicação e significado para as estações climáticas ou a quase ausência delas, a duração do dia e da noite ao longo do ano e o momento do nascer e do pôr do sol ao longo do eixo norte/sul durante o ano e algo menos trivial; a evolução na matéria viva, de um sistema oscilatório com duração periódica de aproximadamente 24h com capacidade de antecipação dos ciclos ambientais associados a posição da Terra no sistema solar.
Por causa da inclinação do eixo da Terra, a quantidade e a duração da recepção da luz do Sol num período de 24h estão em função da latitude. Enquanto na região equatorial, latitude 0º, o dia e a noite duram sempre 12h cada durante todo ano, na latitude 60º norte, em janeiro, por exemplo, o dia dura aproximadamente 5,5h sendo as 18,5h remanescentes, noite. Em julho esta situação se inverte, o dia tem a duração próxima a 18,5h enquanto a noite dura 5,5h. Estes fatos deixam claro o quanto são diferentes as condições de luminosidade às quais os seres vivos estão submetidos ao longo da clina latitudinal da Terra.
Um fato curioso daí derivado, mas não tão fácil de entender, é que o dia nem sempre dura exatamente 24h, se considerarmos que os seres vivos na superfície do planeta sentem ou percebem a passagem do tempo diário não pela rotação da Terra, mas sim pela informação claro/escuro emanante desta rotação. Não é conhecido nenhum sistema sensorial em qualquer animal que tenha a capacidade de captar a rotação da Terra, portanto esta informação é captada principalmente através da visão que é sensível a duração do dia ou da noite ou o nascer e pôr do Sol. O período de um dia para um observador da luminosidade se dá, por exemplo, a partir do tempo decorrente entre dois nasceres do Sol. Devido ao eixo inclinado da Terra e posição no espaço em relação ao Sol, os horários do seu nascer acontecem em horários diferentes dia a dia em função da latitude e da época do ano, de forma que, deste ponto de vista os dias podem ser ligeiramente maiores ou menores do que 24h dependendo da época do ano.
O dia interior e a organização temporal interna
Uma área da Biologia está intimamente ligada às relações astronômicas entre o Sol e a Terra e os parâmetros de luminosidade com periodicidade próxima a 24h que ocorrem no nosso planeta derivados destas relações; a Cronobiologia, que investiga como se expressa temporalmente a matéria viva.
O tempo na matéria viva ou os ritmos biológicos se expressam em uma grande variedade de períodos, mas uma faixa de período em especial é bem evidente por estar claramente associada ao ciclo geofísico dado pela rotação da Terra, a faixa circadiana.
O termo circadiano tem origem no latim circa diem e significa cerca de um dia, assim podemos dizer que os ritmos circadianos biológicos se expressam como uma temporalidade que pode ser conceituada como dia interior, pois se expressa com temporalidade próxima de um dia de 24h e é endógena, ou seja, se expressa também independentemente de fatores externos.
Experimentos clássicos nos meados do século XX (ASCHOFF, 1965) revelaram que indivíduos isolados de pistas temporais ambientais e de relógios, em laboratórios ou cavernas, expressam períodos circadianos próximos, mas diferentes das 24h de um relógio, passam a dormir e acordar a cada 24,5h, por exemplo, após 24 dias nessas condições atemporais um individuo que dorme costumeiramente por volta das 23h estará dormindo às 11h da manhã. Experimentos mais modernos, com pessoas em condições controladas de um laboratório no qual não há pistas temporais, o ciclo sono/vigília, a secreção hormonal e a temperatura corporal central entre outras (ou quase todas) variáveis fisiológicas se expressam como oscilações com periodicidade ou indicam dias interiores com duração entre 23,7 a 24,6horas (DUFFY et al., 2001; CZEISLER et al., 1999).
Quando consideramos a expressão da periodicidade circadiana num organismo devemos imaginar que cada parâmetro fisiológico oscila e apresenta valores de expressão máxima e de expressão mínima ao longo do dia interior e valores intermediários entre os picos e vales, como a imagem de uma curva senoidal, de forma que os valores de máximos e mínimos de cada parâmetro se repetem a cada aproximadamente 24h, sincronizados. Se considerarmos estes processos na sua totalidade é possível notar, por exemplo, que o início do sono mantém uma relação temporal razoavelmente estável com a fase de diminuição da temperatura corporal, que por sua vez mantém uma relação com o aumento da secreção do hormônio melatonina que mantém uma relação com a secreção do cortisol e que todos mantêm relações temporais (relações de fase) entre si, formando o que pode ser definido como uma organização temporal interna. Uma configuração temporal sincronizada em humanos, por exemplo, durante o sono, é uma alta concentração de hormônio de crescimento no início do sono, alta concentração de melatonina e baixa temperatura corporal na metade da fase de sono e alta concentração do hormônio cortisol no final da fase de sono. A manutenção das relações de fase ou a sincronização dos momentos de expressão de processos fisiológicos relativos à regulação geral e as respostas eficientes de um organismo ao ambiente em que vive está altamente associada ao que consideramos uma boa saúde.
Integração temporal
O conhecimento gerado na área de Cronobiologia permite contextualizar o tempo biológico no âmbito do tempo ambiental. Permite também entender a expressão oscilatória de variáveis fisiológicas como, por exemplo, os horários do ciclo sono/vigília como a expressão de um fenômeno que é resultante do ajuste do dia interior ao dia exterior.
A captação dos sinais ambientais se dá através do sistema nervoso. Este sistema é uma espécie de interface entre o ambiente interno do organismo e o ambiente externo, há um sem número de células sensoriais na periféria de um corpo que, por meio de suas especificidades, são capazes de decodificar diferentes sinais ambientais como luz, ondas sonoras, forças mecânicas entre outros, transformando-os na linguagem do sistema, os impulsos nervosos, que são processados e integrados como informação ao estado de funcionamento do organismo, o que permite a emergência de respostas fisiológicas adaptativas para tais sinais ambientais.
Um dos sinais ambientais que se apresenta de forma cíclica na natureza e que, portanto informa temporalidade é o sinal do claro/escuro (dia/noite) que é decodificado, ou transduzido como se diz em Neurociências, no olho na estrutura denominada retina. A informação do nível de luminosidade ambiental chega à retina, onde existem milhões de células fotoreceptoras e neurônios, é transduzida num sinal elétrico que é transmitido cérebro adentro. Essa sinalização luminosa além de ser a informação que o nosso cérebro usa para constituir nosso sentido da visão, é também informação temporal emanante do ciclo geofísico claro/escuro ao qual estamos submetidos diariamente.
O fator cíclico ambiental que age como pista temporal para os seres vivos é denominado, em Cronobiologia, zeitgeber (do idioma alemão, doador de tempo). O processo de reação ao zeitgeber (claro/escuro) resulta na sincronização do dia interior ao dia exterior e se dá principalmente pelo arrastamento que consiste no ajuste temporal dos ritmos circadianos interiores aos ritmos ambientais.
O arrastamento acontece através do sistema de temporização circadiano; um conjunto de redes neurais que processa a temporalidade de 24h e a integra como informação para o organismo como um todo por meio de sinais nervosos e humorais. O efeito do zeitgeber no sistema circadiano não é sempre o mesmo ao longo de um dia, o que se observa é que a resposta ao sinal luminoso durante o dia pode ser encurtamento do dia interior (avanço de fase), de alongamento do dia interior (atraso da fase) ou nula dependendo do momento no qual a informação luminosa atinge o sistema circadiano e também da intensidade do zeitgeber (FOSTER; KREITZMAN, 2004, p. 21). Em humanos a luz no final da noite ou pela manhã encurta o dia interior e nos faz dormir mais cedo, por exemplo, (ZEITZER et al., 2005). Já no final da tarde e início da noite a luz alonga o dia interior e gera um efeito contrário atrasando o horário de dormir, no meio do dia não faz efeito (ZEITZER et al.,2000). Assim por meio do arrastamento, ritmos circadianos endógenos ou dias interiores ligeiramente maiores ou menores que 24h são integrados ao dia exterior pelo sinal do zeitgeber de forma a se expressarem com período praticamente idêntico ao ambiental o que é uma resposta adaptativa.
Evolução Humana e adaptação ao claro/escuro ambiental
O conhecimento em evolução biológica permite entender o tempo biológico ou a regulação temporal como processos susceptíveis a moldagem evolucionária. Permite interpretar a repetição e a alternância de eventos na natureza de forma temporal organizada e cíclica como fatores que contribuíram para que evoluíssem, nos seres vivos, formas de resposta eficiente e antecipatória às mudanças do clima, das horas do dia e das estações do ano. E por fim permite interpretar a expressão dos ritmos circadianos nas populações humanas modernas a partir do contexto histórico nos quais eles evoluíram. Deste ponto de vista é interessante analisar as características do claro/escuro nas quais evoluíram nossos ancestrais. A análise da sequencia histórica de fósseis na linhagem filogenética humana revela que desde os primeiros primatas bípedes, os Australopitecus, que aparecem no registro fóssil há aproximadamente de 3,5 milhões, passando pelo Homo habilis, pelo Homo erectus, e finalmente chegando Homo sapiens, o qual tem registros fósseis com idade de aproximadamente 200 mil anos, todos apareceram no leste da África em locais próximos à linha do Equador, em uma região conhecida como Grande Vale do Rift, especificamente onde hoje estão Etiópia, Quênia, Tanzânia e Somália.
Desta forma quando consideramos os ancestrais bípedes da nossa espécie, não é difícil perceber que tivemos aproximadamente três milhões de anos de adaptação a zonas equatoriais, onde as pistas de luminosidade ambiental são constantes ao longo do ano; dias e noites com duração de aproximadamente 12h com muito pouca variação, inclusive de temperatura.
Por volta de 70 mil anos atrás nossos ancestrais sapiens em movimentos migratórios graduais ocuparam pouco a pouco a Ásia, a Europa, a Oceania e as Américas (STANFORD, 2004). Podemos imaginar que esta diáspora inicial da espécie humana a partir de regiões equatoriais na África foi acompanhada de diversificação morfológica, fruto de adaptações necessárias à sobrevivência em diferentes condições climáticas e ambientais existentes nos outros continentes.
Entre estas condições climáticas destacam-se as condições de luminosidade e temperatura ao longo do eixo norte-sul latitudinal. Nossos ancestrais partiram de um local no qual praticamente não existem variações na duração do dia e da noite ao longo do ano, para regiões distantes do Equador onde estas variações são muito grandes. O movimento migratório, primeiro em direção ao norte, levou nossos ancestrais a ambientes bem menos constantes com muito mais tons de sazonalidade, inclusive acompanhada de variação da luminosidade ao longo do ano. As mudanças sazonais e as pressões seletivas inerentes a elas devem ter sido um fator chave na formação do gênero Homo, incluindo o erectus, que também fez essa rota.
É lícito supor que parte destas adaptações aumentou as chances de sobrevivência dos nossos ancestrais em ambientes com alternância entre dias curtos e noites longas para dias longos e noites curtas e também para épocas de frio extremo e escassez de alimentos que acompanhavam as condições de luminosidade. É interessante imaginar que tais adaptações permitiram a emergência de um sistema de temporização circadiano suficientemente plástico que tivesse a capacidade de sincronizar com essas novas condições nunca experimentadas antes na história da espécie. Estudos modernos em genética mostram como genes associados à adaptação e a temporalidade circadiana emanante do ciclo claro/escuro estão encravados na história filogenética do Homo sapiens por mais de 10 milhões de anos. (CAL SABINO et al., 2014)
Portanto é premente enfatizar que filogeneticamente o homem tem uma longa história de milhões de anos de adaptação ao ciclo claro/escuro e a organização temporal na natureza associada a este ciclo. Vale ressaltar que, somente nos últimos dois séculos, principalmente a partir da transição para a sociedade industrial esta informação ambiental passa a ser transformada em grande escala pela ação social do homem, levando a emergência de um novo ambiente temporal.
O novo ambiente temporal na história da espécie humana
Os ritmos circadianos biológicos são a expressão de processos de ajuste temporal da organização interna relativos a eventos rítmicos ambientais. Embora sejam constituídos por respostas de ajuste, estes ritmos se compõem também por uma temporalidade endógena que é particular de cada indivíduo e que foi desenvolvida durante o processo evolutivo da espécie como adaptação as forças naturais. É interessante pensar como este sistema de temporização circadiano filogeneticamente construído lida com as novas pistas ambientais de temporalidade surgidas após a revolução industrial como as horas marcadas nos relógios, a luz artificial, a organização temporal do trabalho e o modo de produção capitalista que impõe os horários sociais de trabalho.
O século XIV marca o início da disseminação dos relógios mecânicos na Europa. Os séculos XVII e XVIII marcam o aumento da precisão, sua ascensão em importância e popularização. Thompson (1991, p. 279) em seu livro Costumes em comum descreve esta popularização e cita W. Radcliffe sobre os tecelões em Lancaster na década de 1790: “os homens tinham todos um relógio de bolso”, e toda casa “era bem equipada com um relógio numa caixa de mogno elegante ou refinada”.
A mudança de percepção do tempo de um dia ligada à difusão dos relógios dirige a percepção humana, em grande escala, para um tempo estável, homogeneizado e cria uma falsa imagem de uma temporalidade de 24h que se mantém inalterada ao longo do ano, o que de fato acontece somente em regiões equatoriais. Assim o tempo do relógio se desloca do tempo solar e ocorre na consciência humana uma espécie de alienação do tempo circadiano ambiental, este atrelado a posição geográfica em que se vive no planeta, se aliena da temporalidade circadiana local em prol de uma temporalidade generalizada e globalizada. E embora Copérnico e Galileu há muito haviam trazido a mente humana a consciência da esfericidade da Terra, a cultura do tempo após a popularização dos relógios leva a mente humana sorrateiramente de volta a ideia de planicidade do nosso planeta.
O tempo do relógio passa a servir de referência para a hora de acordar e de dormir, para as horas das refeições e para regrar a vida das pessoas. Torna-se possível e disseminado então pensar o dia não como uma sequência de eventos na natureza ou no ambiente em que se vive, mas sim como uma coleção de horas e minutos. Sem dúvida a contagem do tempo pelas horas serve muito bem para contar as horas de trabalho, disciplinar os empregados e sincronizar o trabalho numa fábrica como muito bem descreve Thompson (1991, p. 267-304) em Tempo, disciplina de trabalho e capitalismo industrial.
O estabelecimento das zonas de fuso horário no final do século XIX como corolário da disseminação da ideia de um horário homogeneizado e globalizado aumenta a possibilidade de descolamento da percepção humana de uma temporalidade local, alguns poucos exemplos podem deixar isso bem claro; duas cidades a 15º de distância na mesma latitude tem momentos de nascer e pôr do Sol com diferenças de uma hora, embora se estiverem na mesma zona de fuso horário os horários do relógio sejam os mesmos. Cidades com latitudes diferentes são ainda mais contrastantes, se compararmos Natal e Porto Alegre, por exemplo, há no mês de junho uma diferença de aproximadamente duas horas na hora do nascer do Sol e no mês de dezembro aproximadamente a diferença de três horas para o pôr do Sol entre estas duas cidades.
Além da questão dos relógios outra aquisição tecnológica contribuirá para o deslocamento da percepção humana da temporalidade local; a iluminação artificial. O advento e massificação da iluminação artificial nas ruas e nas casas promove o achatamento do sinal claro/escuro ambiental e, portanto a diminuição do contraste entre o dia e a noite, de forma que atualmente vivemos (nas grandes cidades principalmente), em locais mais escuros, dentro de prédios, durante o dia, e em locais mais claros durante a noite, pois a luzes em casa ou em outros locais como a fábrica, estão acesas. A poluição luminosa passa a ser a forma mais disseminada de alteração do ambiente na sociedade moderna. Assim a criação cultural do tempo de 24h medido pelas horas do relógio, a criação das zonas de fuso horário, o estabelecimento e definições de tempo padrão internacionais e a iluminação artificial atuam como uma conjuntura temporal circadiana paralela, descontextualizada da temporalidade local, esta ultima associada ao tempo circadiano solar. Tal conjuntura se apresenta então como nova pista temporal na história da nossa espécie no planeta. Uma nova pista para um sistema de temporização circadiano que evoluiu por milhões de anos como produto de adaptação ao ciclo claro/escuro ambiental.
O novo ambiente temporal como ameaça à saúde
Não é difícil imaginar que na emergência histórica da consciência humana como produto da seleção natural, o dia e a noite e a temporalidade implícita neste ciclo tenham sido objeto da percepção dos seres que nos antecederam neste planeta. Por isso observamos na história da contagem do tempo circadiano, a princípio, sistemas culturais que tinham como referência a organização temporal circadiana externa; o canto do galo, a ordenha das vacas leiteiras, o nascer do sol, momento mais quente do dia, o formato da sombra, o pôr do Sol, a noite, o galo e assim o ciclo se repete diariamente e sucessivamente.
Do ponto de vista evolucionário o novo ambiente temporal circadiano associado primeiramente, a revolução industrial e tecnológica, ao surgimento do capitalismo e a cultura do relógio tornada massificada no capitalismo industrial, está presente em grande escala há aproximadamente três ou quatro gerações humanas, o que não é tempo suficiente para produzir mudança na constituição populacional que se constitua como evolução biológica.
Desta forma as pessoas atualmente lidam com esta transformação do ambiente temporal com um sistema biológico que evoluiu como adaptação a outro ambiente circadiano; o ciclo claro/escuro natural e a sequência de aparecimento de elementos na natureza que reforçavam esta informação. Interessante notar aqui a dialética do processo adaptativo; uma população que se adapta eficientemente ao seu ambiente, o transforma em tão grande escala que as gerações futuras surgidas a partir das populações ancestrais não são mais adaptadas a este novo ambiente produzido. Assim o que vemos hoje é que esse comportamento adaptativo temporizado está sendo constantemente desafiado pela forma como se vive, principalmente, nas sociedades urbanas modernas. Os ambientes iluminados durante a noite e a necessidade de se cumprir compromissos sociais pela manhã são estímulos que tem como consequência dormir mais tarde e acordar mais cedo que o desejado e que, portanto tem como consequência o encurtamento da fase de sono ou a sua privação. A privação de sono crônica a qual as populações das grandes cidades vêm sendo submetidas é um dos maiores desafios modernos na área de saúde pública e medicina preventiva. Como perdemos sono principalmente na fase final, nas últimas horas da noite ou primeiras horas da manhã, quando acontecem em grande parte os sonhos, podemos dizer que somos uma sociedade sem sonhos.
O sonhar está intimamente relacionado à consolidação da memória, a capacidade cognitiva e a atenção (ACKERMANN; RASCH, 2014). Portanto a privação de sonhos está associada a problemas de memória, diminuição da capacidade cognitiva e déficits de atenção tão comuns na sociedade moderna.
A privação de sono crônica pode trazer como consequência a degeneração da saúde. Está associada, por exemplo, a alteração de múltiplas vias metabólicas levando a resistência à insulina, diminuição do dispêndio de energia, aumento do apetite e alterações imunológicas, portanto está associada a diabetes, a obesidade e a problemas cardiovasculares, o que caracteriza modernamente a Síndrome metabólica. (LUCASSEN et al., 2012; KNUTSON, 2010)
Grupos sociais de faixas etárias específicas são particularmente vulneráveis. Os adolescentes têm um padrão natural de atraso do horário de início e final do sono que é mais proeminente nos centros urbanos (LOUZADA et al., 2008), mas, no entanto, o que acontece na maioria das escolas é que eles estão sujeitos a horários de início das aulas nas primeiras horas da manhã, o que os obriga a acordar ainda mais cedo a fim de chegar a tempo na escola. Esse padrão de horários leva ao acúmulo de débito de sono durante a semana que geralmente é compensado nos finais de semana, quando este grupo etário em geral dorme bem tarde e acorda também bem tarde ao redor do meio dia ou mais tarde, horas nas quais a exposição à luz solar não alcança mais o sistema de temporização circadiano num momento que pode produzir o avanço da fase do sono. Desta forma produzindo mais atrasos de fase. Tais atrasos chegam ao seu auge no domingo, no entanto na segunda-feira o adolescente tem acordar cedo e recomeça o ciclo de privação de sono. O adolescente privado de sono tem suas funções cognitivas e mnemônicas debilitadas nas primeiras horas da manhã e, portanto não está propenso a aprender. O que estamos fazendo com nossos adolescentes? Escolas nos EUA e Inglaterra já adotam horários de início de aula mais tardios levando em consideração a informação gerada por especialistas da área de Cronobiologia.
São abundantes na literatura em Cronobiologia os efeitos deletérios a saúde associados à vida neste novo ambiente temporal. Um zeitgeber fraco não promove a integração temporal eficiente de forma que assim o dia interior se expressa não integrado e, portanto com período diferente do dia exterior esta dessincronização do dia interior com o exterior se apresenta, por exemplo, como comportamentos fora dos horários sociais mais comuns, tais como o inicio do sono no final da madrugada ou no meio do dia.
Se há certa desorganização temporal interna os ritmos dos diversos parâmetros fisiológicos podem se expressar com relações de fases incomuns, por exemplo, o sono no momento em que a temperatura corporal está alta, ou demandas cognitivas como numa sala de aula podem ocorrer em momentos que a temperatura corporal esta baixa, ambas as combinações descritas caracterizam estados fisiológicos nos quais nem o sono nem os processos cognitivos serão eficientes.
A organização social humana impõe uma temporalidade na qual a maioria das atividades trabalhistas e educacionais ocorre entre 8h e 18h, portanto os indivíduos que estão sincronizados a este horário têm uma tendência a um melhor desempenho. Parte da população, entretanto, está biologicamente sincronizada em horários incomuns e vive num estado dessincronizado aos horários sociais o qual poderíamos chamar de Jet lag social, em alusão ao desarranjo temporal sofrido por viajantes aéreos que passam por vários fusos horários (WITTMANN et al., 2006).
Além do problema da adaptação ou sincronização aos horários sociais mais habituais, a sociedade urbana moderna traz alguns desafios temporais ao sistema de temporização biológico. Por exemplo, viagens transcontinentais nas quais vários fusos horários são ultrapassados em pouco tempo (o já citado, Jet lag) e trabalho noturno.
Na sociedade moderna existe uma grande demanda temporal para realização de atividades ao longo das 24 horas do dia, como por exemplo, a variabilidade temporal nas escalas de trabalho, os serviços e comércio permanentemente disponíveis, hospitais, estudos noturnos, segurança da população e muitas outras.
O modo de vida na chamada sociedade 24/7 (24h, 7 dias por semana) está fortemente associada a estados de dessincronização interna do sistema circadiano e pode contribuir significativamente para morbidades e alterações no bem estar da saúde humana. (TAKAHASHI et al., 2008)
Os trabalhadores em turnos exercem funções em horários incomuns como durante a noite ou com escala com rodízio de horários. No Brasil somam por volta 20% da força de trabalho, aproximadamente de 10 milhões de pessoas. (MORENO; COLS., 2003) Principalmente para os trabalhadores noturnos, as pistas temporais ambientais são muito atenuadas ou irregulares o que leva a atenuação da sincronização do sistema circadiano e gera um conflito temporal imposto pela obrigatoriedade de se estar acordado ou dormir em horários impróprios para a nossa espécie. A cronicidade da situação leva ao aumento do índice doenças cardiovasculares, câncer, distúrbios psiquiátricos, de outras várias doenças e da saúde e bem estar geral. (GEMELLI et al., 2008)
Sabe-se que os distúrbios do humor, o distúrbio bipolar e a depressão estão associados à regulação anormal da ritmicidade circadiana, como por exemplo, do ciclo sono/vigília e embora a etiologia destas patologias seja extremamente complexa e não completamente entendida, uma possível explicação seria que uma disfunção do sistema de temporização circadiano causasse dessincronização entre parâmetros fisiológicos, o que dificultaria o arrastamento dos ritmos circadianos aos zeitgebers naturais causando parte dos fenótipos observados nestas doenças. De fato o conhecimento em Cronobiologia traz a perspectiva de oferecer opções de tratamento não farmacológico para problemas psiquiátricos com luz azul ou luz muito brilhante, os quais tem se mostrado eficientes em muitos casos. (ASARNOW et al., 2013)
Uma doença muito prevalente na sociedade moderna é o câncer, que se caracteriza biologicamente como divisão celular descontrolada. O ciclo de divisão celular está sob controle do sistema de temporização circadiano, a dessincronização dos ritmos circadianos pode ser um fator que leva a proliferação celular descontrolada e ao câncer. A sincronização temporal entre a secreção dos hormônios cortisol, melatonina e adrenalina tem sido implicada no controle do crescimento de tumores. (GREENE, 2012)
Conclusão
Desta forma diante do exposto sobre o conhecimento que se acumula a respeito das relações entre a saúde e o tempo circadiano e as reflexões e ações no mundo que se tornam possíveis a partir dele, devemos mover nossos olhares para as possíveis discrepâncias entre os horários sociais e o comportamento temporizado resultante do ajuste entre os ritmos circadianos individuais e a percepção e processamento, pelo sistema nervoso, do tempo solar. Afinal, a organização social humana deve seguir na direção de tentar produzir mudanças nos horários internos de cada um de nós a fim de adaptá-los aos horários sociais ou flexibilizar os horários sociais objetivando uma adaptação aos horários biológicos resultantes do processo evolutivo?
O entendimento da dimensão e da forma de expressão biológica do tempo considerando as formas como se dão as interações entre o organismo com as pistas temporais recentes e ancestrais na história humana devem fazer parte da formação médica e devem ser objeto de políticas públicas que tenham como alvo a saúde humana e a organização temporal da sociedade.
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