Nanoestrutura biomimética para tratamento de insuficiência hepática aguda

O fígado é o órgão responsável por desempenhar funções cruciais no organismo, como filtragem do sangue e eliminação de toxinas. Doenças que afligem este órgão são responsáveis por cerca de 1,5 milhões de óbitos ao ano no mundo. A insuficiência hepática aguda (IHA), por sua vez, se enquadra em uma das condições mais graves, embora raras, de doenças que atingem o fígado. A IHA é caracterizada por uma falência maciça de hepatócitos (células parenquimatosas do fígado) culminando em súbita disfunção hepática, geralmente associada ao uso de fármacos, ingestão de venenos ou a infecções bacterianas e virais. Embora os tratamentos convencionais e padrão-ouro, como o transplante de órgãos, sejam recomendados para casos de IHA, desafios relacionados à baixa disponibilidade de doadores e à rejeição do transplante têm afastado a medicina do tratamento efetivo da doença. Alternativas de tratamento de IHA recentes, como as terapias de células-tronco, se mostraram promissoras. No entanto, a rota de entrega e fraca estabilidade das células dificultaram a viabilidade e uso da terapia. Como alternativa de aprimorar o tratamento, pesquisadores da Universidade de Macau, na China, propuseram uma abordagem inovadora de nanoestrutura biomimética estável inspirada nas funções de células-tronco para alívio de sintomas e tratamento de IHAs.

A nanoestrutura biomimética é projetada para imitar processos biológicos em nanoescala. Além de biomimética, a estrutura também é multifuncional, executando processos como o de distribuição direcionada de medicamentos e a simulação de tecidos naturais de aplicações diversas. Com isso,  inspirando-se tanto nas funções das células-tronco quanto na maquinaria da nanoestrutura, os pesquisadores desenvolveram uma estrutura adaptada, revestida de membranas de hemácias, responsiva aos ambientes oxidativos, capaz de transportar medicamentos e relacionada a fatores regenerativos (Figura 1). Para demonstrar sua efetividade na regeneração hepática, assim como seu efeito protetor contra danos oxidativos no fígado e mitigação da IHA, foram realizados testes in vivo em camundongos, a partir da indução do quadro patológico por lipopolissacarídeos, galactosamina e paracetamol. Os resultados do estudo mostraram que a nanoestrutura auxiliou na redução do dano oxidativo e da inflamação no fígado de camundongos com IHA, além de mostrar uma regulação negativa dos processos imunoinflamatórios do fígado e uma regulação positiva das vias de regeneração do tecido hepático, obtidas a partir de uma análise de RNA-seq1. Além disso, o grupo utilizou a estrutura encapsulada com drogas hidrofóbicas e hidrofílicas, com efeitos antioxidantes e anti-inflamatórios, que auxiliam na minimização dos sintomas agudos da doença e, também, na regeneração.

Embora os resultados sejam promissores no tratamento de IHAs no contexto apresentado, é importante ressaltar que os modelos de indução em camundongos possuem limitações e podem não imitar com fidelidade a IHA humana, ressaltando a necessidade de pesquisas futuras. Além disso, o avanço constante da nanomedicina tem permitido a continuidade de estudos para o aprimoramento dos modelos atuais e, consequentemente, o desenvolvimento de novas estratégias terapêuticas mais eficientes que as convencionais.


Figura 1: Projeto e mecanismo multifuncional de uma nanoestrutura biomimética inspirada em nanoestrutura multifuncional mimética para tratamento direcionado de IHA. 
APV: álcool poli(vinílico); PFADT: poli(1,4-fenilenoacetona dimetileno tiocetal); CT: células-tronco; MGV: membrana dos glóbulos vermelhos; NMB: nanoestrutura multifuncional biomimética; IHA: insuficiência hepática aguda; M1: macrófagos pró-inflamatórios (especializados no combate às infecções) e M2: macrófagos anti inflamatórios (relacionados ao reparo tecidual). 
ACS Nano 2024 , 18 , 7 , 5951–5964.
  1. RNA-seq ou sequenciamento de RNA (do inglês “RNA sequencing”) é uma técnica molecular utilizada para analisar a expressão gênica e identificar os tipos de RNA presentes em uma amostra biológica.

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